Um dia, um dia
Quando abrirem esse testamento, não adiantará mais me maldizer, pois tão-já estarei no Inferno; mas o pouco que tenho, que não serve para nada nem para ninguém, o rateio assim:
Os meus diários, por favor, messer Donato, mantenha-os consigo para queima (como já disposto em versão anterior desse documento), fazendo antes a derradeira anotação; a minha coleção de moedas truste, que voltem aos seus donos, vivos ou mortos (Breno, Donato e o meu falecido tio-avô José); meus livros, a uma biblioteca pública; o que houver no bolso direito das minhas calças, deixo ao Érico, o direito geralmente está vazio; ao Nilton delego a tarefa de queimar o meu envelope de originais, para que eu não caia no ridículo dos escritores medíocres, nem vá nada parar em horrendas antologias; os meus discos, os deixo a messer Orlando. O meu coração, repartam-no e dêem um pedaço para cada um dos meus afectos mal-sucedidos; a minha cabeça, separem-na do corpo, para que os meus pensamentos não me persigam na Vida Eterna, de preferência bem-longe, na Argentina. Mandem os meus olhos para a Europa: o direito para Florença e o esquerdo para Moscovo.
Do meu emprego e das minhas rendas – pois há que os cobice – que façam o que bem entenderem.
Quem pagará meu enterro e meu funeral? Quem pagará um cruz de metal? Toquem o Glória do Ivan Susanin. Isso pouco importa, já terei ido. Me interessa tanto quanto quem irá virar a folha do meu calendário ou escutar o meu despertador tocando de manha; ou quem estiver dormindo na minha cama, vestindo o meu pijama.
3 Comentários:
$%&*@#**!! eu não vou ficar com nada não!!!! nem uma meia velha, ou um dente careado!!
afinal eu sou mulher é, não mereço, tá
Eu não mexo em bolso de defunto. Tenho medo de alma!
Enviar um comentário
<< Home