Os meus anos 1980
Vê, como passa o tempo. Vê, como te pungem as lembranças, como se fossem alfinetes, as mais sutis e como facadas as mais doloridas. Pontadas pelo corpo todo. Lembrança dum tempo antigo, no qual as tardes ainda eram livres e o sol punha-se tingindo o céu dum denso fulvo. Que os merídios tinham sol a pino, fulminando as formigas, mas o céu era azul. Vê, as lembranças dos dias cinzentos de chuva, vistos por detrás da janela da sala. Desenhos com hidrocor e giz de cera. Calendários de escritório abóbora, giratórios, em italiano. Missas, recomendações para a sexta-santa, quermesses; um tempo que não volta mais. Hoje as tecnologias tiram a graça a tudo, havia os Correios, esperava eu as cartas, envelopes imensos; telefone era coisas para os outros, celular, somente as membranas das aulas de Ciências. Quarta-feira era dia de hastear a bandeira e cantar o Hino Nacional. Nem o Hino Nacional de canta mais. Chapéus de jornal, espadas do mesmo material. Bigodes de guache. Fitas verde-e-amarelas de papel crepom. Domingo, o cheiro de molho levantava vôo por dentre as casas, no céu azul do domingo. Manjericão, jogo de futebol, visita à vó. Bolos, bolachinhas caseiras, conversas recheadas de sotaque doutros povos, histórias do Velho Mundo. Sonhos d’Europa. Discos de vinil com boleros, passodobles. Histórias duns bons tempos.
2 Comentários:
Ah, o velho mundo, caro conde! Ainda lembraremos, saudosos, destes dias que correm.
saudades, saudades
quisera eu voltar no tempo somente um instante para comer os bolinhos de chuva da minha avó, passados ainda muito quentes no açucar e na canela, despejados numa tigela onde me pareciam um sem fim de bolinhos, que não acabariam nunca...
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